quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Surpresas

(quando o amor se estende a toda uma família)


 

Nesta casa, somos três a ser amados desmedidamente. Somos três a ser mimados. A ser surpreendidos. Meu amor cuida de cada um de nós de forma idêntica. Nunca há uma demonstração de afecto que não seja extensível aos meus filhos. Por isso, este amor é tão especial.

No outro dia, chegou com os braços carregados de flores. Saiu para ir comprar o jantar e voltou com três vasos de flores. Não flores mortas e embaladas. Flores vivas, como eu gosto.

Deixou-as em cima da mesinha da sala, sem dizer nada. Que o meu amor é um homem de gestos, não de palavras. Fingi que não vi. Às vezes, gosto de o provocar. Mas os miúdos viram-nas e reagiram de imediato, com a maior naturalidade do mundo. E foi esta espontaneidade que me emocionou. Porque eles perceberam logo, não foi preciso explicar nada.

A roseira branca era para o Vasco, o nosso Principezinho que gosta tanto de cuidar da sua rosa. A que ele tinha no parapeito do quarto deixou de dar flores, parece ter entrado em hibernação. Foi o primeiro vaso a desaparecer.

A mini-árvore das malaguetas era para o Diogo. Numa outra incarnação o meu filho grande deve ter sido indiano, porque adora sabores picantes. No dia anterior tinha acabado de inventar mais um molho capaz de fazer fumegar um morto. Eu ralho, mas o meu amor acha piada a estas incursões na cozinha que me esvaziam os frascos das especiarias. Foi o segundo vaso a desaparecer.

Sobrava uma planta simples. Nem bonita, nem feia. Um bocadinho fora do vulgar. Nenhum de nós sabia o nome. O Vasco quis saber o porquê daquela flor, especificamente. Os rapazes já sabem que, por trás de cada acção do meu amor, há sempre um motivo específico. Normalmente, complexo. Que requer amplas e aprofundadas explicações. Os rapazes riem-se sempre, não se cansam de dizer que ele é a pessoa mais inteligente que conhecem. Ele é a pessoa mais generosa que eu conheço. Porque além do conhecimento, nos dá tempo. O tempo que passamos a dedicar-nos aos outros será sempre o melhor presente.

O nome da minha flor não interessa. Não sabemos. Mas a minha flor é magenta. Uma cor que não existe no espectro. Raríssima na natureza. Uma espécie de ilusão de óptica. Uma cor que para existir precisa do olhar humano, subjectivo por definição. “Um olhar especial, como o teu”, disse ele.


2 comentários:

  1. Quando, lá para trás, se fechou uma porta...apareceram 3 lindos vasos a apanhar luz da janela! Um abraço...

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    1. Ohhh, coitadas das minhas flores... luz é coisa que já não abunda por aqui! Já entrámos na estação das trevas. :) Beijinho, Mariana.

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