sexta-feira, 18 de outubro de 2013

O que faz uma pessoa?

(onde se percebe como raio viemos aqui parar…)


O que faz uma pessoa que está há nove meses a trabalhar para uma empresa sem receber? Uma pessoa que se deixou enredar na ideia de que, se deixasse de trabalhar, perderia tudo o que está para trás. Uma pessoa que, finalmente, começa à procura de outro emprego, mas os meses passam e não arranja nada.

O que faz uma pessoa quando, aos poucos, vai perdendo a esperança, a motivação, a auto-estima, o gosto pela vida? Uma pessoa que se deixa engordar, que se desleixa, que se torna baça. Uma pessoa que está deprimida e ninguém à sua volta parece perceber.

O que faz uma pessoa que dá por ela a deambular numa casa que odeia, numa terra que odeia, onde vive há 10 anos porque é conveniente para o trabalho do outro? Uma pessoa a quem a crise obrigou a criar raízes no sítio errado e que nada consegue fazer para mudar.

O que faz uma pessoa que se entregou durante 18 anos de alma e coração a um projecto de vida que, de repente, deixa de fazer sentido para o outro? Uma pessoa que, subitamente, é confrontada com o final de um casamento, no momento em que mais precisava do outro.

O que faz uma pessoa que foi mãe a tempo inteiro durante o dia, permitindo ao outro fazer  carreira, e tradutora a tempo inteiro à noite, quando vê que perdeu tudo? Uma pessoa que se arrastou esgotada, durante anos, sem se questionar se seria feliz, numa espécie de missão quimérica de fazer o melhor para a sua família.

O que faz uma pessoa que se vê sozinha com duas crianças, sem família por perto, sem dinheiro? Uma pessoa que habituou os seus filhos a um certo nível de vida que sabe que não poderá manter. Uma pessoa que se sente encurralada, que já não tem capacidade para ver uma luz ao fundo do túnel. 

O que faz uma pessoa quando o corpo começa a falhar aos poucos? O que faz uma pessoa quando toca no fundo?
 
Não faço a mínima ideia do que outras pessoas fariam... Sei o que eu decidi fazer, numa altura em que não tinha grande capacidade de raciocínio e andava em modo de sobrevivência. Fiz as malas, peguei nos miúdos e parti. Dizem-me que fui corajosa. Sinceramente não acho que tenha sido a coragem que me moveu. Foi o desespero. Foi desespero puro que me levou a deixar Portugal, a família e os amigos para procurar uma solução noutro país. Diz-se que corajoso é quem foge para frente, cobarde é quem foge para trás… eu fugi para a frente sem olhar para trás.

4 comentários:

  1. É essa coragem que me falta e não estou com metade dos problemas que aqui falas. Felicidades onde quer que estejas.

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  2. Espreitei o teu blog... com essas mãos de fada, podes ter a certeza de que conseguias ganhar a vida em qualquer parte do mundo. A coragem vem quando for o momento.

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