segunda-feira, 1 de maio de 2017

Fazemos nós #3

 (onde aproveitamos uma prenda para dar asas à imaginação)




Este Inverno, decidimos fazer um hotel para insectos. Lemos bastante sobre o assunto, pesquisámos imagens na net e fomos apanhar os materiais necessários. Foi um projecto que durou meses, porque eu estava decidida a fazer uma coisa em grande. E bonita. Para além da preocupação com a protecção da biodiversidade, interessava-me o aspecto estético. Não queria nenhum mamarracho no meio do meu quintal. Já me basta o arco de madeira que o homem construiu, de inspiração nipónica. Para ele, bem entendido. Toda a gente que por aqui passa se espanta com o nosso arco do faroeste. O senhorio, incluído. Que era muito lindo e invulgar e coiso e tal… mas gostávamos assim tanto de filmes de cowboys?! O Belga ficou algo ofendido. E eu decidi pespegar-lhe duas trepadeiras por ali acima para ver se disfarçava. Continua um belo mono. Daí ser tão importante não estragar mais a paisagem com um hotel para insectos desenxabido.

Li algures que um terço dos insectos que fazem a polinização e contribuem para o controlo biológico das pragas não encontra abrigo durante o Inverno. Necessitam de espaços ocos para abrigar as larvas até à Primavera em buracos de árvores, tijolos ou pedras. Por aqui, quase todos os jardins têm hotéis para insectos e casas para os passarinhos, com comida. Mas são umas coisinhas mixurucas. Os verdadeiros hotéis para insectos são demasiado eco-hippies para o meu gosto. Ou, então, são verdadeiras obras de arte caríssimas. Tipo… para cima de 300 euros. Daí ter decidido lançar mãos à obra. Infelizmente, o universo estava decidido a conspirar contra mim.

Um dia fomos dar um passeio num bosque aqui perto, para apanharmos pinhas e paus. Os insectos gostam de se esconder dentro da madeira. Entretanto, vi um campo de milho. E vai de tentar roubar discretamente uma maçaroca para o Peanuts. O problema é que aquilo é difícil de arrancar (percebi demasiado tarde que ainda estavam completamente verdes). O roubo acabou por não passar despercebido, porque fui esbarrar contra a protecção eléctrica e apanhei um choque que me fez dar um uivo pouco discreto. Adiante. Passados uns tempos, fomos apanhar lama. Convém pincelar as paredes com lama para atrair os insectos. Não é fácil arranjar lama de tipo argiloso. Lembrámo-nos de invadir discretamente uma reserva de borboletas que estava fechada no Inverno para obras. De facto, não nos enganámos. Conseguimos uma caixa cheiinha de lama. Para além do Vasco, claro. Coisa pequena conseguiu ficar com lama até à cabeça, porque se esbardalhou numa poça, quando o mandámos encher disfarçadamente a caixa. Deve ter sido a invasão de propriedade mais estranha a que os trabalhadores da obra já assistiram (quando somos apanhados em flagrante delito, costumamos falar português muito alto para justificar não conseguirmos ler os painéis de aviso). Também houve aquela vez em que obriguei o meu amor a ir buscar uns restos de xisto no meio do entulho. Os hotéis para insectos ficam mais protegidos das intempéries se tiverem um bom telhado. Felizmente, o Belga tem as vacinas do tétano em dia. Mas acabámos a fugir de um cão raivoso. Depois, houve aquela ocasião em que o adolescente jurou que nunca mais saía connosco, porque engracei com um tijolo de terracota cheio de buraquinhos. Diz que os materiais de recuperação são ideais para construir os hotéis para insectos, dado que o plástico e o vidro têm tendência a criar bactérias. O tijolo estava abandonado em cima de um muro, não fazia falta a ninguém. E nós fomos bastante discretos durante passeio pela aldeola, pois levamos o tijolo embrulhado num casaco debaixo do braço...

A verdade é que consegui reunir todos os objectos de que precisava, a custo zero. Comprei muito pouca coisa. Um metro de tela de arame para galinheiro e a madeira, que o senhor acedeu a cortar à medida graças aos meus lindos olhos. Entretanto, começou a nevar e nunca mais parou. Esteve um frio desgraçado nos últimos meses. Mas estas férias da Páscoa, o calor voltou em força. E eu lembrei-me do meu projecto tão adiado. Arregacei as mangas e fui buscar o material que andámos a recolher com tanto esforço durante todo o Inverno. Estava lá tudo. Excepto a madeira cortada à medida que – espanto dos espantos – tinha exactamente o mesmo tamanho da nossa mesa de jantar que estava a abanar. O Belga decidiu fazer-me uma surpresa e arranjá-la, nestas últimas férias. Não me ocorreu perguntar onde tinha desencantado a madeira. Tal como não me lembrei de perguntar onde tinha encontrado o arame para reforçar o composto que o intrépido D. Fuas Roupinho insiste em destruir para roubar comida podre. Está visto que nunca faço as perguntas correctas. O Belga levou uma descompostura, porque usou os meus materiais sem pedir. E eu levei uma descompostura pois devia era agradecer-lhe as reparações. Seja como seja, o meu grandioso hotel para insectos ainda não viu a luz do dia. Mas hoje a minha sogra faz anos pensei que, apesar de tudo, podia tentar construir um modelo pequenino para ela pôr debaixo do telheiro onde plantou as roseiras. Não é exactamente a obra de arte que tinha em mente. Digamos que é um parente pobre, mas bastante esforçado.


2 comentários:

  1. Por cá há na casa...penso que a 19€, um exatamente igual ao que tu construíste!

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    1. No dia em que a tradução me falhar, dedico-me aos hotéis para insectos! :)

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