segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

Ah, sim… e os outros clássicos

(onde se relatam outros pequenos hábitos que vêm com o frio)



A saga do atraso crónico na troca de pneus não é, infelizmente, o único clássico com que inauguramos o nosso ano. Há pior. Bastante pior.

A água do bebedouro do Peanuts fica totalmente congelada, obrigando-nos a trazê-lo para dentro. E lá começa a ronda de noites sem dormir com aquele coelho demoníaco a atirar-se contra as grades da gaiola. A caixa é grande como um sarcófago, juro. E ele até passa imenso tempo a saltitar pelo quarto do Vasco. Mas à noite, sabe-se lá porquê, o tipo quer à força sair. É um fadário, acreditem.

Depois, temos o friorento D. Fuas. Com a chegada do Inverno, o nosso cão entra em negação profunda (tal como a dona) e recusa-se a fazer as necessidades lá fora (não se preocupem que eu continuo a ir ao local habitual, embora mais depressinha, que a casa de banho do palacete não é aquecida). O D. Fuas ainda chega a espreitar pela porta… mas volta logo para dentro, mal põe as reais patas na neve. E toca de fazer as necessidades urgentes à frente do aquecedor da sala. Ninguém duvida que é muito mais agradável do que pespegar o traseiro na neve. Infelizmente, a casa aquecida é habitada por humanos que prezam a salubridade. Pequeno detalhe que o digníssimo cão tenta ao máximo ignorar. Até um de nós de passar e o atirar para cima de um monte de neve. Os primeiros dias são sempre mais difíceis para o D. Fuas. Uma vez português, para sempre português.

Excepção feita para os meus queridos filhos, que se belgificaram há muito e insistem em levar-me ao desespero. Este ano, só consegui convencer o grande a usar luvas e Kispo. Gorro e cachecol são coisas de criança. Consta que não dá estilo. E mesmo o Kispo tem de discreto. Discretíssimo. Na realidade, trata-se de um simples blusão preto ao qual decidimos tacitamente chamar ‘Kispo’ a bem da sanidade materna. A minha, portanto. Sei perfeitamente que não muda nada. O Diogo não fica mais quente por isso, mas sinto-me mais descansada. Como é evidente, no que toca ao filho pequeno, as coisas piam mais fino. Durante 5 minutos seguidos, se tanto. Ainda consigo obrigá-lo a usar a artilharia toda antes de sair de casa: botas da neve, Kispo, gorro, luvas e um lenço polar a tapar o pescoço. Também já não gosta de cachecóis. Jura a pés juntos que o estrafegam. O problema é que, se me distraio, fica tudo no carro. Diz que tem calor. Estão -11º. Mas a pobre criança sofre com o calor. A caminho da escola, despe-se todo a uma velocidade contrariamente proporcional ao tempo infinito que demora a vestir-se de manhã. E fá-lo de mansinho, para ver se escapa. Às 7h30 ainda estou meia a dormir e enregelada, pelo que acaba por escapar quase sempre. Quando espreito pelo retrovisor para me assegurar de que entrou na escola (parece que não sou a única maluca a ter esta mania: no outro dia, o meu amor admitiu envergonhado que também só conseguia arrancar depois de ver o portão fechar), já só vislumbro um Vasco saltitante de Kispo aberto. O resto ficou no carro, claro. Esforço-me por pensar que eles nunca estão doentes. Que nunca estão constipados. Nem ranhosos. Há séculos que não sei o que é um espirro, uma febre, uma tosse. Não há bicheza que sobreviva a este frio glaciar. Todos os anos tento ver com optimismo o copo meio cheio. Não consigo. Só vislumbro água congelada.


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