(ou
as maravilhas da adolescência)
O
ensino obrigatório na Bélgica divide-se em ciclos de seis anos: ensino primário
e secundário. A avaliação é contínua. Não há dois testes por período, como em
Portugal, mas pequenos “controlos” o ano inteiro. Ou seja, a matéria dada é de
imediato controlada/avaliada. Todas as semanas, fazem pequenas avaliações. Mal o
aluno tenha negativa é enviado para a “remédiation”, onde um professor da
disciplina revê a matéria. (Breve parêntesis para dizer que o Diogo foi à remédiation de Inglês com 13 valores, nota
muito inferior ao habitual.) Em Dezembro e em Junho, fazem exames internos que
duram, no mínimo, duas horas (no secundário podem durar quatro). A cada dois
anos, os exames são nacionais. E isto desde o primeiro ano, com apenas seis
anos. É naturalíssimo, não há cá pais stressados, nem meninos a vomitar com
nervos. Na primária, fazem os exames de manhã e, à tarde, preparam o seguinte.
No secundário, têm duas semanas de pausa lectiva para estudar antes da época de
exames. No colégio do Diogo, os primeiros anos têm direito a coaching escolar gratuito. Fazem sessões
de estudo individual e acompanhado, bem como diversas actividades para
descomprimir. Nos últimos anos, é suposto serem autónomos.
O
resultado deste sistema de avaliação é que as crianças criam hábitos de estudo cedo.
Não há outra solução. O Vasco nunca traz muitos trabalhos de casa, mas tem de
estudar todos os dias para preparar os testes e o ditado da semana. Nem sequer
é preciso dizer nada, é a primeira coisa que faz quando chega (depois de
enfardar o segundo lanche da tarde). Durante a época de exames, é
impressionante a quantidade de horas que este miúdo é capaz de ficar concentrado
a estudar sozinho. E, o mais importante, em oito anos de vida adquiriu um
enorme prazer em aprender. A sua curiosidade insaciável sempre foi estimulada
pela escola belga, onde teve a sorte de iniciar o percurso escolar.
Com
o filho crescido, as coisas são diferentes. O Diogo também é um miúdo
inteligente e que gosta de aprender. Mais, adora a escola onde anda. Sente-se
bem lá, gosta do ambiente, do espaço... Este ano chegou a lá ir, no início de
Setembro, dar uma espreitadela para matar saudades. Adora os colegas e a
generalidade dos professores. Excepto Matemática, gosta de todas as disciplinas.
Passado o choque de o termos obrigado a escolher Ciências 5, até disse que
adorava as aulas práticas, no laboratório. O único problema é que o Diogo
entrou neste regime escolar depois de cinco longooos
anos de ensino português, onde se habituou à lei do menor esforço. Ao
conhecimento colado a cuspo na véspera dos testes, sem quaisquer hábitos ou
método de estudo.
Quando
o Diogo chegou à Bélgica, no final do 5º ano, regressou à escola primária.
Trabalhou muito para aprender a língua e conseguir fazer os exames nacionais de
acesso ao ensino secundário. Mas, fundamentalmente, a nível dos programas
escolares, a dificuldade não era grande para um miúdo esperto como ele.
No
ano seguinte, enquanto os colegas se estavam a habituar a um novo sistema
bastante mais exigente, com professores e disciplinas diferentes, nada daquilo
era novidade para o Diogo. Nos dois primeiros anos do secundário teve sempre
boas notas apesar de pouco estudar. Sobreviveu à custa de alguns conhecimentos
mais avançados que trazia de Portugal. Da excelente cultura geral e da lendária
memória de elefante. Sobreviveu com uma certa sobranceria, diga-se de passagem.
Mas,
no 3º ano, as coisas mudam radicalmente. Na Bélgica, o sistema separa o trigo
do joio muito cedo. Demasiado cedo, a meu ver. Os alunos com piores resultados
são encaminhados para o ensino técnico logo no 3º ano. Se a coisa continuar a
correr mal, são depois encaminhados para o ensino profissional. Não há abandono
escolar, mas o ensino vai-se adaptando às “capacidades” do aluno. No final do
6º ano, há quem siga para a universidade, para o ensino tecnológico ou para o
mundo do trabalho, já com um diploma profissionalizante. É de referir que o
acesso a certo tipo de profissões está vedado a quem não possuir estes diplomas
específicos.
O
Diogo está no ensino designado por “geral”. Numa rede de colégios privados
inserida no ensino católico, o mais exigente. Aliás, tal como o Vasco. A nossa
escolha não se deveu ao acaso. Nem à fé cristã ou ao espírito elitista. Muito
menos à proximidade geográfica, bem pelo contrário… mudámo-nos para esta terra
exactamente por causa das escolas. E estamos longe de sermos os únicos. Num
país onde a estratificação (segregação?) começa tão cedo, há que oferecer-lhes
a melhor educação possível.
Deste
modo, percebe-se que o nível de exigência no 3º ano aumente exponencialmente. É
preciso estudar a sério para se ter boas notas, já não se consegue viver à
sombra de conhecimentos passados. Ora o Diogo não estava minimamente preparado
para dar este salto, porque infelizmente a formatação que recebeu em Portugal é
difícil de apagar. E as notas começaram a descer nestes primeiros dois meses de
aulas, obviamente. Nada que nos surpreendesse, já estávamos à espera disto há
algum tempo. Mas o Diogo continua estupefacto, sem reacção. Incomodado por já
não ter as excelentes notas a que estava habituado, mas ainda não completamente
convencido de que terá mesmo de mudar de atitude face ao estudo daqui para a
frente.
Começámos
por ter grandes conversas com o Diogo que – adolescência oblige – não tiveram qualquer efeito. Depois, decidimos meter mãos
à obra e ajudá-lo a estudar. Mas eu não tenho paciência. Só de ver aquela
mochila, tenho ataques de nervos. Apetece-me gritar. O meu amor é mais calmo,
mais eficaz… e bastante mais torcionário. Decidiu controlar-lhe os cadernos e a
matéria dada, como faria a um miúdo mais pequeno. O Journal de classe. Obriga-o a recopiar textos ilegíveis e a
organizar folhas perdidas. Fez-lhe um ficheiro Excel que tem de ir actualizando
com as notas. Dá-lhe explicações quase diárias de Matemática e Ciências, para desespero
do Diogo. Eu vou começar a dar-lhe explicações de inglês, para ver se
regressamos às médias habituais. Até agora, ainda não houve resultados. Excepto
as crises de resmunguice juvenis (que eu, aliás, compreendo perfeitamente… se a
minha mãe me tivesse arranjado um padrasto destes, o mais certo era ter fugido
de casa). O Diogo não se tornou mais humilde, nem mais aberto à aprendizagem.
Ainda não aceitou que, a partir de agora, terá de começar a ser mais organizado
e a criar uma rotina de estudo quotidiana.
Percebi que isto precisava de medidas drásticas e decidi adoptar a conhecida
teoria da cenoura. Comprei bilhetes para a antestreia mundial do novo Star Wars, exclusiva na Bélgica, França
e Holanda. Imprimi os bilhetes e disse-lhe que os pregasse no quadro de cortiça
por cima da secretária. Quando lhe der a preguiça e a motivação falhar, só tem
de olhar para ali. Caso as notas não comecem a subir, pode oferecer as entradas
a um amigo qualquer, porque eu não o levo. É que não levo mesmo, por mais que
ele esperneie. O meu amor riu-se muito, quando lhe falei da minha teoria da
cenoura. Achou que era mais um voto de confiança, mas enfim… E decidiu
combiná-la com outra teoria educativa, acabada de sair da forja: a teoria da
anti-cenoura. Num novo quadro, rabiscou um horário de estudo carregadíssimo. Uma
coisa horrorosa. Comentei que me parecia um bocadinho excessivo… para não dizer
claramente insuportável. Respondeu-me que era de propósito. A teoria da cenoura
puxa à frente, a teoria da anti-cenoura empurra atrás. Uma dá motivação, a
outra aversão. O objectivo, segundo o meu amor, é fazer com que o Diogo deseje que
aquela tortura acabe o mais depressa possível. “Ele há-de começar a estudar a
sério… quanto mais não seja, para se conseguir ver livre de mim!”, explicou-me. Hum... acho que comigo não teria resultado, mas eu nunca tive o brio escolar dos meus filhos.
Ambas
as teorias juntas, passe o pleonasmo, entraram na fase dos testes preliminares.
Daqui por umas semanas, comunico os resultados. Talvez até faça aqui um
sorteio, quem sabe? Será o primeiro giveaway
do Amigo Imaginário, onde se oferecem três bilhetes para a antestreia mundial
de Star Wars – The Force Awakens. Só
terão de vir a Liège no dia 16 de Dezembro, claro. E trazerem-nos um cházinho para os nervos.
Enquanto funcionar a cenoura e a anti-cenoura, a coisa vai muito bem. O pior são os miúdos que são amorfos, tanto lhes faz. Não me importava de ir a Liège mas tenho a certeza que o Diogo vai dar bom uso aos bilhetes :)
ResponderEliminarMiúdos amorfos é que não, Gralha! Não há paciência! Quer dizer, se o mais pequeno fosse só um 'cadinho amorfo... ;)
ResponderEliminarAdorei! Eu devia ler o teu blog mais vezes! :) Gostava muito de estar com os meus sobrinhos em Liège para a antestreia do Star Wars, mas já vou estar em Portugal com o meu irmão e os meus outros sobrinhos. Beijinho muito grande para todos!
ResponderEliminarDeves pensar que não me lembrei logo de ti, quando fui ver o dia da antestreia... mas já me tinhas dito que não ias estar em Frankfurt. :( Lá terei eu que gramar aquela seca... sim, que o Pascal já se pôs ao fresco!
ResponderEliminarAté daqui por 15 dias!!! <3