(onde aproveitamos uma prenda para dar asas à imaginação)
Este Inverno, decidimos fazer um hotel para
insectos. Lemos bastante sobre o assunto, pesquisámos imagens na net e fomos
apanhar os materiais necessários. Foi um projecto que durou meses, porque eu estava decidida
a fazer uma coisa em grande. E bonita. Para além da preocupação com a protecção
da biodiversidade, interessava-me o aspecto estético. Não queria
nenhum mamarracho no meio do meu quintal. Já me basta o arco de madeira que o
homem construiu, de inspiração nipónica. Para ele, bem entendido. Toda a gente
que por aqui passa se espanta com o nosso arco do faroeste. O senhorio,
incluído. Que era muito lindo e invulgar e coiso e tal… mas gostávamos assim
tanto de filmes de cowboys?! O Belga ficou algo ofendido. E eu decidi pespegar-lhe
duas trepadeiras por ali acima para ver se disfarçava. Continua um belo mono.
Daí ser tão importante não estragar mais a paisagem com um hotel para insectos desenxabido.
Li algures que um terço dos insectos que
fazem a polinização e contribuem para o controlo biológico das pragas não
encontra abrigo durante o Inverno. Necessitam de espaços ocos para abrigar as
larvas até à Primavera em buracos de árvores, tijolos ou pedras. Por aqui, quase
todos os jardins têm hotéis para insectos e casas para os passarinhos, com
comida. Mas são umas coisinhas mixurucas. Os verdadeiros hotéis para insectos são
demasiado eco-hippies para o meu gosto. Ou, então, são verdadeiras obras de
arte caríssimas. Tipo… para cima de 300 euros. Daí ter decidido lançar mãos à
obra. Infelizmente, o universo estava decidido a conspirar contra mim.
Um dia fomos dar um passeio num bosque aqui perto, para
apanharmos pinhas e paus. Os insectos gostam de se esconder dentro da
madeira. Entretanto, vi um campo de milho. E vai de tentar roubar discretamente uma maçaroca para o Peanuts. O
problema é que aquilo é difícil de arrancar (percebi demasiado tarde que ainda estavam completamente verdes). O roubo
acabou por não passar despercebido, porque fui esbarrar contra a protecção
eléctrica e apanhei um choque que me fez dar um uivo pouco discreto.
Adiante. Passados uns tempos, fomos apanhar lama. Convém pincelar as paredes
com lama para atrair os insectos. Não é fácil arranjar lama de tipo argiloso.
Lembrámo-nos de invadir discretamente uma reserva de borboletas que estava
fechada no Inverno para obras. De facto, não nos enganámos. Conseguimos uma
caixa cheiinha de lama. Para além do Vasco, claro. Coisa pequena conseguiu ficar
com lama até à cabeça, porque se esbardalhou numa poça, quando o mandámos
encher disfarçadamente a caixa. Deve ter sido a invasão de propriedade mais estranha
a que os trabalhadores da obra já assistiram (quando somos apanhados em
flagrante delito, costumamos falar português muito alto para justificar não
conseguirmos ler os painéis de aviso). Também houve aquela vez em que obriguei
o meu amor a ir buscar uns restos de xisto no meio do entulho. Os hotéis para insectos ficam mais protegidos das intempéries se tiverem um bom telhado.
Felizmente, o Belga tem as vacinas do tétano em dia. Mas acabámos a fugir de um
cão raivoso. Depois, houve
aquela ocasião em que o adolescente jurou que nunca mais saía connosco, porque engracei com um tijolo de terracota cheio de buraquinhos.
Diz que os materiais de recuperação são ideais para construir os hotéis para
insectos, dado que o plástico e o vidro têm tendência a criar bactérias. O
tijolo estava abandonado em cima de um muro, não fazia falta a ninguém. E nós
fomos bastante discretos durante passeio pela aldeola, pois levamos o tijolo
embrulhado num casaco debaixo do braço...
A verdade é que consegui
reunir todos os objectos de que precisava, a custo zero. Comprei muito pouca
coisa. Um metro de tela de arame para galinheiro e a madeira, que o senhor
acedeu a cortar à medida graças aos meus lindos olhos. Entretanto, começou a nevar e nunca mais
parou. Esteve um frio desgraçado nos últimos meses. Mas estas férias da Páscoa,
o calor voltou em força. E eu lembrei-me do meu projecto tão adiado. Arregacei
as mangas e fui buscar o material que andámos a recolher com tanto esforço
durante todo o Inverno. Estava lá tudo. Excepto a madeira cortada à medida que –
espanto dos espantos – tinha exactamente o mesmo tamanho da nossa mesa de
jantar que estava a abanar. O Belga decidiu fazer-me uma surpresa e
arranjá-la, nestas últimas férias. Não me ocorreu perguntar onde tinha
desencantado a madeira. Tal como não me lembrei de perguntar onde tinha
encontrado o arame para reforçar o composto que o intrépido D. Fuas Roupinho
insiste em destruir para roubar comida podre. Está visto que nunca faço as
perguntas correctas. O Belga levou uma descompostura, porque usou os meus
materiais sem pedir. E eu levei uma descompostura pois devia era
agradecer-lhe as reparações. Seja como seja, o meu grandioso hotel para insectos ainda
não viu a luz do dia. Mas hoje a minha sogra faz anos pensei que, apesar de
tudo, podia tentar construir um modelo pequenino para ela pôr debaixo do
telheiro onde plantou as roseiras. Não é exactamente a obra de arte que tinha em mente. Digamos que é um parente pobre, mas bastante esforçado.
Por cá há na casa...penso que a 19€, um exatamente igual ao que tu construíste!
ResponderEliminarNo dia em que a tradução me falhar, dedico-me aos hotéis para insectos! :)
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