(onde se explica o inexplicável e sai uma explicação algo confusa)
Diz
que o Natal é já amanhã. E eu ainda sinto que tudo isto é muito estranho.
Muitíssimo estranho.
Supostamente,
este ano, podíamos “saltar” o Natal. Porque os rapazes vão estar em Portugal. E
nós íamos namorar. Mas, depois, percebi que as aulas só acabavam na
sexta-feira. Sim, no dia 23 de Dezembro. Pior… oficialmente, as férias belgas
só começam na segunda-feira, dia… hum…
26 de Dezembro. A Terra do Frio, às vezes, consegue ser um bocadinho sui generis. O que quer dizer que íamos
mesmo ter de improvisar um Natal qualquer, antes da partida da nossa rapaziada.
Filho pequeno assim o decidiu. Embora o espírito natalício andasse por parte
incerta. Mas não deixa de ser estranho pensar que, amanhã, vou mandar os miúdos
arrumar as mochilas da escola e aperaltarem-se para a consoada.
Entretanto,
fiquei de férias forçadas. Lá no trabalho mandaram-me para casa. Sem apelo, nem
agravo. Parece que ainda tinha vários dias para gozar obrigatoriamente até ao
final do ano. Por mais tempo que passe, não há meio de conseguir atinar com
esta ramboia de férias e folgas e feriados. Feriados específicos à Valónia. Mais
os nacionais e os municipais. E os dias de folga estipulados na minha convenção
de trabalho. É muita folga para uma só criatura. Lá se me foi a desculpa do excesso
de trabalho. Tive mesmo de enfeitar a casa. Comprar prendas. E fazer muitos ho,
ho, ho! Bom… e começar a traduzir um livro. Não deixa de ser estranho
aproveitar as férias forçadas (e pagas) de um trabalho para fazer outro.
Depois,
decidi ser falsamente simpática. Já devia calcular que a vida sabe sempre
quando estamos a fazer batota. Convidei os pais do meu amor para virem jantar
connosco na nossa consoada. Mas sempre pensei que recusassem. Nunca vi pessoas
tão activas e viajadas. Estão sempre a ir ou a vir. Ou a trabalhar. Ou a
filmar. Ou a fazer mergulho. Ou a organizar concursos de cinema. Ou… Só que,
entre tantas idas e vindas, o meu sogro arranjou tempo para ver o Vasco, num
destes fins de tarde. Coisa pequena recebeu mais um daqueles diagnósticos que
me fazem tremer a pernas (e as finanças). Por mais que eu barafustasse, o meu
amor decidiu rumar com ele ao consultório do pai, para ouvir uma segunda
opinião. Infelizmente, concordante com a primeira. Apressei-me a enviar um SMS
de agradecimento. Parece que o meu filho foi mais educado e, à saída, perguntou
muito sério: “Quanto é que lhe devo, Monsieur?”. Arrancou umas valentes
gargalhadas, o meu palhaço do circo. Mas achei que devia fazer mais qualquer
coisa para agradecer o gesto. Bom… os muitos, muitíssimos, gestos de
afabilidade e simpatia de que temos sido alvo nos últimos anos. E em má hora me
lembrei de os convidar para jantar. Na nossa noite de Natal. Segundo consta, a
mãe do meu amor queria fazer exactamente o mesmo, mas não tinha coragem. Talvez
a minha vontade férrea de distanciamento, afinal, não seja tão discreta como eu
julgava. Pelo que o convite foi pronta e entusiasticamente aceite. O que não
deixa de ser estranho, tendo em conta que ando a fugir airosamente de eventos
familiares há quase quatro anos.
Eis-me,
então, na véspera do nosso Natal. O tal que era suposto não ser festejado este
ano. E que, além da tribo, ganhou mais dois salvo
seja convidados. Já fui comprar pratos e talheres e copos. E mais umas mil coisinhas.
Na realidade, como nunca recebemos ninguém, não tínhamos nada. Somos pessoas de
uma simplicidade constrangedora, quando postos em contacto com a sociedade… assim… no geral. Essa é que é a verdade.
Portanto, tratei de disfarçar o melhor que pude o… hum… desapego das coisas mundanas que reina nesta casa. Também
tratei de adaptar o menu. Não ia só servir o bacalhau com natas e o peru
recheado exigidos pelos meus filhos. Depois de apuradas investigações, percebi
que os belgas servem as entradas em verrines.
E as sobremesas também. As minhas colegas de trabalho – que só me queriam ver
pelas costas a bem do respeito da legislação belga que rege as férias e folgas
e feriados e dias de descanso e mais que houvesse – decidiram ajudar um
bocadinho a tuga de serviço. Descobri que as verrines são todo um mundo. Que terá obviamente de conviver com o
chouriço assado e o bolo-rei desencantados no Luxemburgo. Que se lixe, entre
mortos e de feridos, alguém há-de escapar. O que é o mesmo que dizer que espero
não cometer nenhuma gaffe
gastronómica de monta. E conseguir agradar às duas metades tugo-belgas. Não vai
deixar de ser estranho ver a broa de milho ao lado do tartare de saumon.
Entretanto,
olhem... a magia do Natal baixou em mim. Estou nervosa, confesso. Mas adorei
preparar esta consoada. Tal como adorei comprar os presentes para a tribo. E
para os pais do meu amor. A vida dá voltas completamente surreais. O reverso da
medalha de não querermos afectos, nem família impostos por decreto é termos
aprendido a gostar de duas pessoas que mal conhecemos. Mas que já percebemos
que devem sentir exactamente o mesmo por nós. E não consigo impedir-me de
pensar que tudo isto é muito estranho...
Se calhar, até vai ser o melhor Natal de sempre. Feliz Natal para si e restante família! Beijinhos
ResponderEliminarE não é que foi mesmo, Célia?! :D Feliz Natal para si também! Beijinho.
EliminarDesejo ardentemente que o Natal seja um êxito e que, sem o stress de uma preparação a longo prazo, o encontro se torne numa feliz memória para os convivas...Aproveito para lhe desejar Festas Felizes e, como é próprio desta época, agradecer os momentos que aqui partilhámos ao longo deste ano, passando de "amigos imaginários" a correspondentes com alguma regularidade...Beijinhos e um abraço virtual, Rita! E tente aproveitar sem culpa alguns momentos de lazer...
ResponderEliminarObrigada, querida Mariana! Apesar de já ter percebido que não é a sua época preferida, espero que tenham sido uns dias de paz e família, como se deseja. Festas Felizes! Um beijinho muito grande.
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