(onde se narra um fim-de-semana de festa
os adultos acabam por fugir)
Desta
vez, não tive o ataque de amnésia habitual que envolve as festas de aniversário em casa.
Ainda me lembrava perfeitamente do descalabro do ano anterior: uns miúdos a
brincar na neve, outros no Home Cinema
a ver um filme, mais uns quantos a brincar às lutas no quarto e os comilões
sempre de roda da mesa a limpar tudo o que eu ia servindo… foi um horror! Como
bom diplomata que é, o Vasco quer sempre convidar a turma inteira, mas depois
arrepende-se porque não consegue gerir aquela malta toda. Ainda tentámos
impingir-lhe uma festa no exterior, mas a coisa pequena não se deixou convencer
nem pelos insufláveis, nem pelo bowling,
nem pelo salão de jogos infantil. Juro que tentei todas as ideias malucas que
me vieram à cabeça… e, em desespero de causa, acreditem que vieram mesmo muitas.
Mas o Vasco estava decidido a receber os amigos em casa e convidar uns quantos
para uma festa-pijama tardia. Por isso, este ano decidi precaver-me. Deixei-o
convidar menos colegas e preparei uma festa temática para entreter as hostes. Não
foi difícil escolher o tema, tendo em conta a última obsessão do Vasco. Às
escondidas, passei tempos infinitos à procura de ideias na Net sobre o universo
de Harry Potter para lhe fazer uma surpresa.
Só
na sexta-feira à noite é que anunciei o tema, que deixou o filho pequeno à
beira da histeria. Imprimi cartazes para espalhar pela casa, listas de
feitiços, imagens para enfeitar a mesa, rótulos tipo “baba de dragão” ou “olhos
de rato”, perguntas para fazer gincanas e tirei ideias giras para decorar a
sala. Além disso, descarreguei a “fonte Harry Potter”, para escrever os nomes
dos convidados. No nosso equivalente à loja dos chineses (mas muito mais chique,
porque é francês!), comprei as decorações: uma coruja, um chapéu mágico, olhos
saltitões, velas led (só para garantir que a criançada não pegava fogo à casa) e
pincéis grossos. Depois de arrancarmos a parte metálica com os pêlos, besuntámos
os pauzinhos com a pistola de cola quente ou com barro e enfeitámos com umas
purpurinas pirosas que encontrámos perdidas numas gavetas… et voilà! Com mais ou menos jeito, num serão divertido, a tribo fez
oito magníficas varinhas mágicas. Depois, limitei-me a fazer um bolo de anos…
do Harry Potter, como não podia deixar de ser. Acho que foi a primeira vez, na
minha já longa existência de mãe, que não fiz uma noitada a preparar o repasto.
A verdade é que me deixei de merdas, os miúdos desta idade gostam mais de
salgados do que de doces. E já não vão lá com umas simples sandes de fiambre, nem com muffins…
Portanto, enchi o congelador de mini-pizzas e mini-espetadas de carne. Mais uns
cachorros quentes e as batatas fritas da praxe. A minha sogra mandou um bolo de
chocolate e o meu amor tratou do outro. Por fim, restavam uns quantos doces “assustadores”.
E muitas pipocas, para gaudio do D. Fuas que adora fazer de aspirador. Quanto
às bebidas, aproveitei umas garrafinhas de vidro onde colei umas etiquetas com
nomes pouco convidativos e enchi com xaropes diluídos de cores estranhas. Aliás,
não comprei a tralha de festas habitual e reciclei os diversos pratos, taças e
tacinhas desirmanadas que por aqui andavam. E, pronto, estava feita a festa com pouco
trabalho, a custo bastante reduzido… e a horas decentes!
O
dia da festa começou com outra festa. Eu explico… Como este ano o dia de Saint-Nicolas
calha a uma terça-feira, a festa foi antecipada. Mas não sei muito bem que justificação
é que os pais belgas deram aos filhos para a greve santa nos dias úteis... Seja
como for, o Saint-Nicolas passou pela Bélgica este fim-de-semana. Em nossa
casa, foi mais despachado e passou logo no sábado de manhã. Quando desceram
para tomar o pequeno-almoço, os rapazes já tinham os seus pratos cheios. Antigamente,
oferecia-se frutos secos, spéculoos,
tangerinas, doces e moedas. Hoje em dia, oferece-se brinquedos e doces. Eu
ofereço sempre parvoíces várias para a paródia ser maior: meias espampanantes, livros
em segunda mão, um relógio-muito-fino-para-não-magoar-o-pulso, um enésimo
carregador para o iCoiso, mais uns phones,
uma pena que escreve, pensos-especiais-para-dedos-roídos, lápis que são
espadas, doces estranhos, um vinho português, uma calculadora histérica que dá
música, lenços de pano, sublinhadores ecológicos, tampões-para-os ouvidos-sensíveis-do-cientista-de-serviço,
coisas para o futuro Kot do filho
grande… Felizmente, o Belga não é tão pateta como eu. O meu prato tem sempre prendas
à séria, é uma espécie de pré-Natal.
Mal
acabámos de ver as prendas e de tomar o pequeno-almoço, trocámos o
Saint-Nicolas pelo Harry Potter. Enquanto o meu amor foi com o Vasco à Reciclagem
(é todo um programa, como expliquei aqui), o filho crescido e eu decoramos a
casa a preceito. Coisa pequena ficou completamente estarrecida quando chegou! Tenho
pena de não termos tirado mais fotografias… mas não houve tempo. Duas crianças
que não tinham confirmado a presença decidiram aparecer de surpresa e tivemos
de fazer varinhas mágicas à pressa. E o meu amor suou as estopinhas para
imitar a bela fonte “Harry Potter” para escrever os nomes deles à mão. A ideia
era colar o nome nas garrafinhas para personalizar as bebidas. O “Filtro do
Amor” fez sucesso entre as raparigas. Os rapazes preferiram o “Sangue de Dragão”
e o “Elixir da Verdade”. Acho que foi a primeira festa em que não tive de
limpar refrigerante entornado, nem dei com copos nos sítios mais estranhos da
casa. A verdade é que o tema Harry Potter acabou por balizar um bocado a
loucura de ter a casa cheia de rapaziada de 10 anos. Os miúdos adoraram,
estiverem entretidos e a confusão não foi tão grande. Fizemos um concurso para
distribuir as varinhas, que durou imenso tempo. Na porta do quintal, colei uma
lista de feitiços… o que acabou por os arrastar lá para fora. Felizmente estava
um dia lindo. Com temperaturas quase negativas, mas solarengo. Quando a
criançada começou a ficar demasiado excitada, o meu amor lembrou-se de fazer um
torneio de bilhar indiano. A seguir, abrimos o banquete. Entre comerem e verem
as decorações, passou-se mais um bom bocado. Imensos miúdos pediram para guardar
as garrafinhas com os nomes, os chocolates com etiquetas estranhas e as snitch douradas
que improvisei com Ferrero Rocher e umas asas. Acabaram por ver aquilo como
decorações e, por mais que disséssemos que podiam comer, ninguém queria
estragar as embalagens porque queriam levar as lembranças para casa! À saída,
podiam tirar um doce mágico do pote dos doces mágicos. Bom… o mais difícil foi
mesmo arrancá-los de nossa casa, no final.
Eu
estava preocupada com o facto de uns miúdos se irem embora e de outros ficarem
cá a dormir, mas acabou por correr tudo bem. A casa foi-se esvaziando aos
poucos e, os que era suposto ficarem, deixaram-se ficar para trás
discretamente. Curiosamente, apesar do repasto faustoso, ainda se empanturraram
com esparguete à bolonhesa ao jantar. Deixámo-los ver um filme às escuras no Home Cinema, na esperança que depois
caíssem de cansaço na cama. Não deu resultado. Tal como não funcionou o meu
ralhete, nem o do belga. O filho grande acabou por pôr cobro à conversa
nocturna com uma das suas ameaças torcionárias: se não se calassem, a meio da
noite ia assustá-los a sério. Calaram-se, claro… não durou foi muito tempo,
infelizmente. Às 6h30 da manhã já estavam outra vez numa excitação parva. Só
que o Diogo dormia a sono solto e não nos veio valer… Ainda os tentámos mandar lá
para cima ver mais um filme, na esperança de que o conseguissem acordar.
Obviamente, o sono adolescente é mais forte do que tudo o resto… filho crescido
limitou-se a enfiar os phones nos ouvidos e virou-se para o outro lado. Como
dois sonâmbulos, fomos preparar o pequeno-almoço para esta gente toda. Acabaram
com o pão, o mel, duas embalagens de leite e uma caixa de cereais. E ainda
assentaram com umas belas fatias de bolo. Não sei que mais teriam comido, se o
meu amor não tivesse decidido acabar com aquele disparate e começasse a
levantar a mesa. Entre vestirem-se, arrumarem o quarto e mais trinta mil
feitiços, começaram finalmente a chegar os pais. Estava eu calmamente a fazer
um café, quando o Belga decretou que tínhamos ganho o merecido prémio do pequeno-almoço
inglês no café da esquina. Largámos os filhos e fugimos à socapa. E tenho a
dizer que soube mesmo muito bem!
[ Saint-Nicolas est passé... ]
[ as primeiras varinhas mágicas ]
[ as meias para libertar os elfos foram um sucesso ]
[ o meu amor quis fotografar a mesa... ]
[ estes jelly beans só tinham sabores bons, mas os palermas demoraram séculos a perceber! ]
[ ainda um dia me dedico ao cake design, pá! ]
[ a alegria do bicho! ]
Sim, senhora: esta experiência pode levar a um caso de empreendedorismo, numa optica de import/export...Conseguir ficar com a casa de pé e entusiasmar os pequenos convivas é uma tarefa de verdadeiros profissionais! Este evento-cobaia mostra que há potencialidades para espalhar estas ideias temáticas, que podem até ser mais alargadas a outros mundos como a Patrulha Pata ou Star wars! Pensem nisso para se distraírem do tema Natal...A sério: parabéns por tererm feito tão feliz o aniversariante!
ResponderEliminarCredo, que ideia! Eu era incapaz de trabalhar com crianças. Estou a chegar à conclusão que só gosto mesmo dos meus. Ou pior, só sou capaz de aguentar os meus. Vá... e os meus três sobrinhos adorados. Festas de anos é coisa que se suporta anualmente... olhe, tipo o Natal!!! :D
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