(porque há momentos em que só a música nos salva)
Apetece-me
escrever o que me vai na alma, mas as palavras têm dificuldade em sair. Em
articular-se. Estou farta de ver a floresta em Portugal a ser dizimada por
incêndios no Verão. Tal como estou cansada dos atentados que propagam o medo
tão perto de nós, nos últimos tempos. Tantas vidas ceifadas. Aos poucos,
aprendemos a ser indiferentes. A seguir com a nossa vida, como se nada fosse. Deixamos
de pedir notícias à família espalhada por essa Europa fora quando algo
acontece, convictos de que nunca serão os nossos. E suspiramos de alívio
porque, apesar de tudo, nos sentimos seguros nesta terriola nos confins das
Ardenas. Não sei o que será pior: a calamidade ou a nossa própria indiferença e
tranquilidade por nos sabermos a salvo… Até quando?
Não
tenho por hábito mostrar os meus filhos a tocar, porque acho que as crianças
não são macaquinhos de circo. Mas hoje abro uma pequena excepção. O Diogo foi
dispensado do exame de órgão em Abril, por estar numa visita de estudo em
Oxford. No final deste segundo ano, teve por isso de apresentar quatro músicas
na audição. É o único instrumento que o filho crescido consegue tocar sozinho em
público. Não está em palco a dar espectáculo, está numa igreja a falar com ele
próprio. Não está a exibir-se virado para a assistência, está face a face com o
mais belo instrumento. No final, o director da Académie deu os parabéns aos dois
jovens músicos, o Noé e o Diogo. Pela excelente prestação mas, principalmente, por serem uma pequeníssima minoria (por coincidências da vida
são ambos portugueses e têm um percurso de vida muito semelhante). O órgão de
igreja não é um instrumento popular entre os adolescentes. É preciso ter coragem
para ser diferente e lutar contra o mainstream.
E força de vontade para ter aulas numa igreja fria, em pleno Inverno. Para além
da humildade de se não se poder mostrar a ninguém o que se faz no recolhimento daquele
espaço sagrado.
Poder-me-ão
perguntar qual a relação entre as catástrofes que nos assolam e o órgão de
igreja (para além do facto de acreditar que a música é salvadora, nestes momentos). A resposta, para mim, está na educação. De uma maneira ou de outra,
estou convencida de que só conseguiremos mudar de paradigma educando as novas
gerações para pensarem “fora da caixa”. Sozinha não consigo fazer nada para
travar o aquecimento global. Ou para combater o terrorismo. Provavelmente, a
única coisa que poderei fazer é educar os meus dois rapazes para serem
anticonformistas, para não terem medo da diferença. Para pensarem pela sua
própria cabeça. Para serem conscientes e defenderem o planeta que os alberga
com todas as suas forças. Para serem empáticos, para se tentarem sempre pôr no
lugar do outro. Para serem altruístas e porem o bem maior acima das suas
próprias necessidades comezinhas. Para criarem pontes entre povos, culturas, línguas,
países. Para terem uma mente aberta, sã, liberta, evoluída. Sobretudo, para serem
imaginativos. Acho que estamos desesperadamente a precisar de pessoas com
imaginação. O mundo tal como o conhecemos está a deixar de fazer sentido, mas
nós continuamos todos cegamente agarrados a uma forma antiga de fazer. De ser e
de estar. Não sou nada defensora do “na minha época é que era”. A minha geração
está a chegar ao poder. Já detém inúmeros cargos de chefia e posições
importantes. E, salvo raras excepções, é uma desilusão. Possamos, pelo
menos, ser bons educadores para que as coisas mudem daqui por uns anos.
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