(mas onde se apanham conchas)
Recomecei
hoje a trabalhar. Felizmente está um dia frio, cinzento e chuvoso. Como os quinze
dias anteriores, diga-se em abono da verdade. Não se pode dizer que tenham sido
umas férias de sonho, mas fartei-me de fazer coisas que se andavam a amontoar
desde a mudança de casa. Coisas úteis, entenda-se. Coisas que, não sendo “tipicamente
de férias”, me deixam uma sensação de dever cumprido. Tipo fazer a declaração
de impostos. Quatro dias antes do prazo limite, antecipação nunca antes vista
por estas bandas. Fazer cortinas para os nossos quartos. Percorrer lojas de
velharias e feiras da ladra para desencantar verdadeiros achados. Passar dias
inteiros a recuperar móveis, no meio do cheiro das tintas que eu adoro.
Estas
férias foram marcadas pela clivagem crescente entre os meus filhos. O pequeno a
brincar feliz no quintal com um sabre de luz, a fazer amigos, a aprender a
jogar xadrez, a passar horas no quarto a brincar com os Legos, a dar passeios
de mão dada connosco, a ver os animais. O grande trancado no quarto a ouvir
música… hum… ruidosa. A devorar
livros e séries. E quilos impressionantes de comida. A fugir de passeios
familiares. A fazer programas com os amigos no Facebook. A ir pela primeira vez
de férias sozinho para o estrangeiro. Foi estranho passar estes dias de férias em
casa a vê-lo crescer mais um bocadinho diariamente, a tornar-se borbulhoso e
resmungão. Respondão. Mas quando me faz um sorriso ternurento e me pede num tom
melado: “Mãe, beijinho…”, percebo que o amor que nos une serve de alicerce
sólido para este tumulto juvenil. E quando o apanho deitado na cama do Vasco a
atazanar-lhe o juízo, compreendo aliviada que, por mais que cresçam, não
conseguem viver um sem o outro. Os irmãos.
E,
no meio de tudo isto, o tempo a dois. Roubado discretamente ao tempo passado a quatro. Um
tempo de ternura e cumplicidade. De acordar com calma e muitos beijos. De conversas
intermináveis noite dentro. Passeios de mão dada. Um tempo de gratidão por esta
presença sólida e constante nas nossas vidas, que me impede de vacilar. Que me
faz rir à gargalhada. E me ensina todos os dias mais alguma coisa. Que me diz tantas palavras bonitas. “Sou a tua
concha”, sussurrou-me o meu amor uma manhã. “A concha que sofre o primeiro
embate e o ampara para te proteger.” Sim, estas férias apanhei uma concha sem sequer
ter visto o mar.
Que bom :)
ResponderEliminarÉ mesmo, Gralha! ;)
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