(onde se percebe que afinal tenho uma confiança cega
nas minhas capacidades)
Andei meses a armazenar frasquinhos de
compota e garrafas de vidro. Obriguei as minhas vizinhas a comerem toneladas de
tangerinas, porque havia uma excelente promoção de 2,5kg por 3.99€. A verdade é que, as poucas tangerinas
que não estavam podres eram uma porcaria, mas vinham numa caixinha de madeira mesmo
gira. Tinha tirado novas receitas da Net. Estava a preparar-me para passar os
próximos fins-de-semana à volta dos tachos a fazer os cabazes de Natal com os
miúdos.
Mas, depois, os meus queridos tios
de Inglaterra decidiram dar-nos uma prenda adiantada e eis-nos convidados a
passar o Natal no outro lado da Mancha. Tive de mudar de planos à última da
hora, pois não me estava a ver a viajar de avião com compotas, bolachinhas de
gengibre e licor de limão na bagagem. Por outro lado, também não podia deixar os
cabazes em casa dos meus “pais belgas” com muito tempo de antecedência. Não me
parece que, nesta altura do ano, a minha “mãe belga” ache muita piada ter o
frigorífico cheio de cabazes de Natal para a família… apesar de as caixas das
tangerinas serem mesmo fofinhas.
A tradição de fazermos as nossas
próprias prendas nas semanas que antecedem o Natal já tem alguns anos. Aos
poucos, fomos aprimorando os cabazes, embora haja sempre umas inovações. Nem
sequer é por uma questão de preço, que estas coisas ficam sempre mais caras. É
mesmo pela piada se sermos nós a fazer, pelo carinho com que fazemos diferentes
cabazes a pensar nas diferentes pessoas. Resumindo e concluindo, eu continuava
decidida a manter a tradição de fazermos as nossas próprias prendas de Natal. Na
impossibilidade de fazer comida, virei-me para o artesanato. E vai daí, lembrei-me
de forrar agendas para 2014.
Chegada a casa com tecidos, agendas,
cola e fitas, deitámos mãos ao trabalho. Quando me vi rodeada de bocados de
tecido a desfiar e fitas que se desenrolavam sozinhas, mandei os miúdos embora.
Tentei colar as fitas com cola branca, mas aquela
porcaria ficava colada aos dedos. Comecei a enervar-me. Fui buscar a pistola de cola quente. Como o
fio não chegava à tomada, tive de desligar as luzes da árvore para tirar a
extensão. O estupor de cão, que não pode ver ninguém de gatas, foi ver o que se
passava. Enrolou-se todo nos fios e fez cair a árvore. Percebi que,
paradoxalmente, não é fácil agarrar numa árvore quando se tem os dedos cheios
de cola. Mal ou bem, lá consegui equilibrar aquilo tudo, mas já estava a ver a
minha vida a andar para trás. E o espírito natalício foi-se, juntamente com a
cola, a árvore e a porcaria das agendas.
Mas que diabo me passou pela cabeça
quando tive esta ideia peregrina?! Como é que fui capaz de pensar que conseguia
forrar agendas, se nem os livros da escola dos miúdos consigo forrar sem deixar as
capas cheias de bolhas?! Aquilo exige gente altamente qualificada. Anos de
prática. Jeito de mãos. Precisão. Instrumentos de trabalho especiais. Além
disso, afinal, quem diabo usa uma agenda em papel nos dias que correm?! Uma ideia completamente estapafúrdia, portanto.
Uma pessoa normal teria comprado uma
agenda, um tubo de cola e teria aproveitado uns restos de
tecido para fazer uma primeira tentativa. Uma pessoa normal teria gasto uma
quantia simbólica para ver se a coisa resultava. E teria feito isto com semanas de antecedência, para ter tempo de ir comprar outra prenda qualquer, caso não
resultasse. Com esta história, descobri que tenho uma confiança cega nas minhas capacidades, porque comprei logo umas 15
agendas, 9 metros de tecido, 4 bobines de fita, 3 potes de cola. E desgracei o
orçamento todo de Natal. Para ajudar à festa, lancei-me nesta quimera uns dias
antes de partirmos. Por muito boa vontade que tenha, já não há volta a dar… De
maneiras que é assim, malta: o amor é muito, mas o jeito é pouco. Perdoem lá
qualquer coisinha e digam que é tudo muito bonito, certo?
E aviso já que, no próximo
Natal, vai tudo corrido a canecas com alces da Suécia do IKEA. Deve
sair consideravelmente mais barato e, pelo menos, não vou andar com os
dedos colados durante dias a fio.
[ Entretanto, a coisa pequena decidiu
perguntar meigamente o que eu queria como prenda de Natal. Disse-lhe que queria
uma máquina fotográfica para lhe tirar fotografias de jeito antes que ele
crescesse demasiado. Respondeu ainda mais meigamente que não tinha dinheiro
para isso, mas que me podia fazer
um desenho muito bonito. Eu concordei, um desenho bonito estava óptimo.
Responde o Diogo lá do fundo: “Um desenho ainda se arranja, bonito é que duvido
muito…”. Haja alguém realista sobre as capacidades artísticas desta
família! ]
Há poucas coisas menos natalícias do que a correria e a pressão a que nos sujeitamos nestas semanas antes do Natal. Este ano quero oferecer um presente a mim própria: a capacidade de aceitar que não consigo fazer tudo, que não sou super-mãe, que alguns planos saem furados, que não sou pior pessoa por isso. Acho que ainda estás a tempo de escrever a tua carta ao Pai Natal ;)
ResponderEliminarna verdade, todos devíamos "escrever ao pai natal" - é que, com isso, descobríamos imenso sobre nós e o ponto de estado da nossa vida...
ResponderEliminarEu sou tão desprovida de fé que nunca acreditei no Pai Natal. Vá... acredito nos votos de Ano Novo. Realizam-se quase sempre... mas também nunca pedi coisas impossíveis, tipo ganhar no Euromilhões.
ResponderEliminarMas acho que aceitar que não somos super-mães (embora nos esforcemos ao máximo por sê-lo) é a melhor coisa que podemos fazer... especialmente nesta altura do ano. Feliz Natal! :)