(ser
ou não ser, eis a questão)
Sempre
que passamos uns dias fora, deixo os animais com a minha vizinha do lado. Por “deixo”
subentende-se uma remuneração à escala belga, evidentemente. O problema é que eu
tenho duas vizinhas do lado. Digamos que sou a vizinha do meio. Nem sequer
posso dizer que me entendo melhor com a vizinha que me fica com os bichos. Temos
tido as nossas pegas, porque não é uma pessoa fácil. Enfim, não tem uma vida
fácil. Mas comecei por lhe pedir a ela, quando nos mudámos para cá há um ano
atrás, e foi ficando. Até porque ela também tem vários animais e trata
muitíssimo bem deles. Nestas coisas, sempre é uma segurança adicional. Contudo,
nos últimos tempos, comecei a pensar se a outra vizinha não se sentiria
ofendida por nunca lhe ter pedido que ficasse com a bicharada. Tipo, se não
acharia que não eu tinha confiança nela. E vai daí, decidi perguntar-lhe se
estava interessada em tomar conta dos animais quando estivéssemos de férias em
Julho. Ok, vou ser totalmente sincera… Também me deu algum jeito fazer-lhe uma oferta mais vantajosa
pelo total das duas semanas (contra o pagamento diário que já tenho instituído
com a outra vizinha). Ela aceitou, toda contente.
“Nem
é preciso pagares-me, que disparate!” “Ora
essa! Era o que mais faltava!” “Não,
senhora! Temos de ser uns para os outros!”
“Pois sim, mas trabalho é trabalho. E tomar conta de 12 animais dá
muitooo trabalho!” “Mas é só dar comida
ao cão e abrir-lhe a porta duas vezes ao dia para o deixar correr no quintal…” “Também é preciso alimentar os outros 11. E
dar-lhes atenção. E mudar a água do aquário das tartarugas. E pôr o coelho na
gaiola exterior, quando estiver bom tempo.”
“Isso não dá trabalho nenhum! Não me vais pagar por isso!” “Ai, vou, vou! Ou aceitas ser paga ou não há
trabalho para ninguém!” “Pronto, pronto…
depois, falamos nisso, está bem?” “Nem
pensar! Fica já combinado.”
Quando
chegámos de férias, a primeira coisa que fiz (quando finalmente me consegui
libertar do D. Fuas) foi espreitar a bicharada. Parecia estar tudo em ordem. Mais
ou menos em ordem. O aquário das tartarugas não estava lá muito limpo. As
gaiolas também precisavam de uma limpeza urgente. Os legumes, que tinha deixado
no frigorífico para os roedores, continuavam lá. Percebi que tinham comido
exclusivamente cereais e feno durante quinze dias. Mas também não vinha mal ao
mundo. O Mignon até parecia maior. Estavam todos vivos e de boa saúde, era o
mais importante.
Quando
limpei a gaiola da porquinha da India e do hamster, achei o Mignon sujo. Mais
crescido, mas bastante sujinho. Pensei que, assim que pusesse pellets e serradura nova, ele trataria
de fazer a sua higiene pessoal. Contrariamente à ideia feita, os roedores são
animais muito limpos. Também achei que estava um bocadinho estranho… não trepou
logo para a minha mão, como de costume. Limitou-se a cheirar-me e a deixar-se
pegar. Mas, bom, após a minha ausência prolongada não me podia queixar. Até
porque o Mignon foi mesmo o único animal a mostrar sinais de estranheza. As
tartarugas, por exemplo, ficaram todas felizes com a escovadela das carapaças
debaixo da torneira. É certo que os répteis não são conhecidos por sentirem
saudades dos donos…
No
fim-de-semana passado, soltei a bicharada à luz do dia. Foi a hora do mimo e da
brincadeira. Constança já voltou a dar guinchinhos quando ouve os meus passos. Os
gerbilos vieram para a minha mão, coisa que nunca tinham feito. Acho que
sentiram falta do contacto humano. E o Mignon também já não estava tão estranho,
embora continuasse sujo. Com manchas castanhas claras no pêlo. Tentei limpá-las,
mas não desapareciam. Chamei o meu amor, o nosso “quase-veterinário” de
serviço. Seria possível aparecerem manchas no pêlo dos hamsters já depois de
adultos? Não, impossível. E seria possível os hamsters anões crescerem mais um
bocadinho depois de adultos? Também não. De repente, surgiu a suspeita… aquele
seria mesmo o Mignon?! O meu amor admitiu logo que também lhe tinha passado o
mesmo pela cabeça, quando o tinha visto depois das férias. Não me tinha dito
nada para não parecer paranoico. Como raio é que aquele hamster podia não ser o
Mignon?! Excepto se algo tivesse
sucedido ao Mignon e alguém o tivesse
substituído, na esperança de que ninguém
desse pela troca. Mas parecia-nos absurdo. Talvez fosse só impressão nossa... Fui à procura de fotografias antigas do Mignon, perdidas no
computador. E, se dúvidas houvesse, teriam desaparecido naquele instante. As
imagens não enganam. Eu acho que não enganam. Aquele Mignon, ao vivo, ao lado das fotografias do outro
Mignon, provavelmente morto, não deixavam margem para grandes discussões: aquele
hamster anão não era o nosso. É ligeiramente maior e, principalmente, tem o pêlo
com manchas castanhas muito claras.
Há
dias que não vejo a vizinha que ficou com os bichos. E, para ser sincera, ainda
bem. Não sei o que fazer. Não sei o que dizer. Confronto-a ou não? E se ela me garante que não fez nada e que aquele é mesmo o Mignon? Parece-me absolutamente incrível
que alguém seja capaz de esconder a morte de um animal, substituindo-o por
outro quase idêntico. Como se um animal de estimação pudesse simplesmente ser
substituído. Como se nós não fôssemos dar pela diferença. Como se não tivéssemos
direito de saber o que aconteceu ao nosso Mignon. O verdadeiro Mignon. Morte
acidental ou por doença, eu nunca deixaria de pagar à vizinha pelo trabalho que
teve a tomar conta dos nossos animais todos. Nem ficaria chateada com ela,
apenas triste. Assim, sinto uma desconfiança atroz. Sinto que deixei a chave de
minha casa e todos os meus animais que adoro a alguém que não merecia essa
confiança. Espero que tão cedo a vizinha não me apareça pela frente. Pelo menos
até eu saber como reagir. Não quero criar má vizinhança com discussões inúteis, mas acho que não
consigo deixar passar o mistério da troca dos Mignons como se nada fosse…
[ o verdadeiro Mignon ]
[ o falso Mignon ]
Apanhou sol e espalhou mal o protector solar?
ResponderEliminarLOL, Gralha! Não me parece...
ResponderEliminarNão posso acreditar...
ResponderEliminarNão era mais simples dizer a verdade?!...
Eu acho que sim... Azares são coisas que acontecem a todos. Já para a mentira não me parece que haja perdão possível.
ResponderEliminarBem, nem quero pensar no que sentiria na vossa situação, mas acho que a vizinha merecia saber que não vos conseguiu fazer o ninho atrás da orelha, bolas! Até pode ter ficado preocupada, constrangida, envergonhada por ter " perdido" o pequeno, mas admitia, caramba, não vos tomava por lorpas... Confronta-a! Sempre ficas com uma oportunidade de medir a reação...
ResponderEliminarPS: este ratinho é lindo, merece beijinhos e mimos!
Claro que o Mignon II já faz parte da família, a culpa não é dele! E, bem vistas as coisas, até se dá muito melhor com a Constança do que o outro. Está sempre colado a ela a dormitar, é um bicho um bocado preguiçoso... para além de ser o único rato que conheço que não gosta de queijo!
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