(conjuram-se
orixás)
Ao
longo da vida, vamos coleccionando sonhos vários. Bonecas russas de diferentes
tamanhos que se encadeiam até ao infinito. Sonhos inalcançáveis, que servem
apenas para nos aquecer o coração. Sonhos que gostaríamos de ver realizados a
longo prazo, mesmo que seja difícil, mesmo que seja quase impossível. Mesmo que
demore muito tempo. Sonhos que nos vão acompanhando ao longo da vida, metas que
estabelecemos no horizonte longínquo e que norteiam o caminho. Sonhos que
sabemos que vamos realizar a médio ou a curto prazo. Sonhos comezinhos, que
proporcionam alegrias pequeninas quando finalmente os conseguimos alcançar.
Balões de oxigénio que nos dão forças para continuar. A avançar e a sonhar,
sempre.
Mas,
um dia, a vida dá uma reviravolta. E temos a sorte de voltar à casa da partida.
Aproveitamos para fazer o ponto da situação. Largar tudo o que já não
precisamos para tornar a passada mais ligeira. Aconchegar junto ao coração quem
mais amamos e esquecer tranquilamente quem já não nos diz nada. Ajustar a
bússola interna. Rever posições. Reformular objectivos. E, claro, adaptar os
sonhos. Refazê-los.
Há
sonhos que percebemos que já realizámos. Às vezes são sonhos antigos, que
ficaram perdidos, mas não esquecidos. E que um dia, sabe-se lá como, se
realizaram sem que dessemos por isso. Há sonhos que mantemos. Fazem parte
daquilo que somos. São os sonhos quase sempre impossíveis de realizar. Há
sonhos que reajustamos à nova realidade. Sonhos que são necessários para
conseguirmos concretizar o objectivo maior a que nos propomos. Metas menores
que balizam o caminho.
E,
depois, há sonhos que são abandonados por completo. Sem apelo nem agravo, sem
remorsos, sem tristezas. Já não têm lugar na nova vida. Perderam todo o
sentido.
Algures
na nossa história de vida, criamos um cemitério de sonhos onde enterramos os
mortos. Sonhos cremados, que desapareceram para todo o sempre numa nuvem de
fumo. Sonhos enterrados a muitos palmos do chão, que se vão decompondo aos
poucos, à medida que fazemos o luto.
O
problema é que há sonhos moribundos que continuam a povoar as profundezas da
nossa existência. Sonhos fantasmas. Sonhos que decidimos conscientemente
abandonar, mas que não nos conseguem abandonar a nós. Que teimam em não se
libertar. Sonhos que obstinadamente se recusam a partir para o céu dos sonhos,
que vivem no limbo do purgatório. Ainda não descobri o que fazer para que parem
de me assombrar. Eu, que os matei, que os enterrei, que os substituí por outros
sonhos por estrear a condizer com esta nova vida que criei. No dia em que
descobrir a conjuração secreta, estarei um bocadinho mais perto de alcançar a tão desejada paz.
Muito bom!
ResponderEliminarÉ mesmo isto!
Gosto de a ler.
ResponderEliminarObrigada, Isa Maria. Sabe sempre bem ouvir isso, mas há dias em que ainda sabe melhor. :)
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