Das condições de trabalho

(que nunca deixam de me surpreender)

Já aqui o disse diversas vezes: a realidade laboral na Bélgica não tem nada a ver com a portuguesa. A diferença está no respeito com que as pessoas são tratadas. No esforço que é feito para ir ao encontro do outro. Embora já esteja habituada, por vezes ainda sou apanhada de surpresa.

Hoje, quando subi para ir aquecer a minha sopa na copa, notei um silêncio estranho. Normalmente, há um certo bulício à hora do almoço, dado que o espaço é diminuto para o pessoal das duas associações que dividem o vetusto edifício. Estava tudo a falar baixinho. Os movimentos eram cautelosos. Perguntei o que se passava. “A Dominique está a dormir”, murmuraram. “Hein?!”, perguntei, admirada. Com o ar mais natural do mundo, lá me explicaram que tinham dado pela secretária a dormir no escritório, com a cabeça apoiada na mesa.

A campanha de angariação de fundos arranca no início do ano. Janeiro é um mês especialmente esgotante para a Dominique, que tem de coordenar as encomendas de gaufres, os diferentes pontos de distribuição e as dezenas de voluntários envolvidos. E muitos milhares de euros, que a deixam sempre numa pilha de nervos. Este ano, para ajudar, a Dominique está adoentada. Nada mais normal do que fazer uma sesta improvisada depois do almoço, em pleno local de trabalho. Alguém se lembrou de ligar o atendedor de chamadas, aumentar um bocadinho o aquecedor e fechar a porta do secretariado devagarinho. E passar a palavra para não se fazer barulho.

Não consegui deixar de pensar que aquele deslize em Portugal provavelmente não seria recebido com a mesma compreensão.