sexta-feira, 10 de junho de 2016

És a minha maçã de Junho


(onde se celebram 15 anos de maternidade)



Fazes hoje 15 anos. Quando nasceste, eu tinha acabado de fazer 25. Era uma miúda. E apaixonei-me perdidamente por ti. Quando tu nasceste, eu cresci. Tornei-me adulta. Demasiado adulta. Foi a única maneira que encontrei de conseguir fazer face à responsabilidade imensa que me impuseste. Tornaste-me mãe. Não uma mãe qualquer, tornei-me tua mãe. E isso exigiu de mim ser a melhor. Ou, pelo menos, eu assim pensava. Não merecias menos. Regressei às origens. Mas ainda era demasiado infantil para aceitar de ânimo leve o peso das diversas mulheres que povoam a nossa família. Depois, cresci. Hoje, percebo que sou esta mãe – a tua mãe – graças à minha própria mãe. À avó Clarisse e à tia Clarisse. À avó Lena. À mamie. Na confluência (diria mesmo, na divergência…) de todas estas ascendências cresci como mãe. Talvez seja por isso que às vezes me falte alguma coerência. Sou muitas numa só.
Entretanto, desisti de ser a melhor mãe do mundo. Contento-me em ser a tua melhor mãe. A melhor mãe que consigo ser para ti. (Para o teu irmão, sou uma outra mãe, que tu nem sempre reconheces e compreendes.) Fazemos hoje 15 anos. Percorremos um longo caminho. E eu vou-me reinventado. Agora tenho 40, devo estar a meio da minha vida. E, paradoxalmente, sou muito mais nova do que aquela outra Rita de 25 anos que te teve. Porque me sinto mais liberta e segura, já não preciso de me agarrar a certezas absolutas. Assumo o erro. Sei que, por vezes, tens vergonha desta minha forma despudorada de ser. Dizes-me: “Ó, mãe, olha aí… pára, pareces uma miúda!” E, no outro dia, estava a ralhar contigo e tu interrompeste-me para perguntar por que raio te estava a tratar por “você”. Tive vontade de rir e disse muito depressa: “Estou-me a rir, mas não é de boa”, como dizia a minha avó Rosália. Trato-vos sempre por “você” quando estou muito zangada, só que nunca te tinha dado para questionar esta minha parvoíce. Estás a crescer e isso aquece-me o coração.
Se eu não consegui ser a melhor mãe do mundo, tu consegues ser o melhor filho do mundo. (O teu irmão também, de uma forma completamente diferente que tu nem sempre reconheces e compreendes.) Quando um bebé nasce, diz-se que a mãe tem de fazer um ajustamento entre o seu bebé imaginário e o real. Entre o bebé com que sonhou e o que lhe nasceu. Eu não precisei. A minha capacidade imaginativa ficou muito aquém da realidade. Tu és melhor do que nos meus sonhos. Não és perfeito. Mas és o meu filho perfeito.
Nestes últimos 15 anos, não tenho qualquer dúvida de que aprendi muito mais contigo do que tu comigo. Sinto que o tempo me escorre por entre as mãos, agora. Já temos tão poucos anos juntos, debaixo do mesmo tecto. Deixa-te ficar por aqui só mais um bocadinho, está bem? Espero ainda poder viajar muito contigo. Adoro conhecer mundo contigo. Gosto dos nossos momentos a dois. Os dias mãe-filho. Gosto de te ver cozinhar, embora nem sempre me agrade o resultado e me enfureça o estado em que deixas a cozinha. Gosto de me aninhar contigo no sofá a ver programas palermas. Gosto que me mandes sms a gozar comigo. Gosto muito de te ouvir tocar. Especialmente trompete, que já vai sendo mais raro. Gosto quando és altivo e te achas o melhor. Gosto da tua segurança. Da tua imensa responsabilidade e autonomia. Gosto quando vamos os dois no carro e tu falas sem parar. Gosto quando trocas um sorriso cúmplice comigo, porque o Vasco fez qualquer coisa que te deixou enternecido. Gostei muito de ver o teu assombro, quando espreitámos a aula de ballet do mano pela frincha da porta. Gosto da nossa cumplicidade, do mesmo sentido de humor subtil. Gosto de te ouvir contar muito depressa o teu dia todo ao Pascal, mal chegas da escola. Gosto quando dizes que é a pessoa mais inteligente que conheces. Mas também gosto quando lhe topas os defeitos e encolhes os ombros a rir. Gosto quando fazes perguntas e queres aprender muitas coisas ao mesmo tempo. Gosto muito da tua companhia, de estar contigo. Gosto que tenhas conseguido tornar isto de ser mãe uma coisa tão divertida.

És a minha maçã de Junho, que eu continuo a amar de um amor espantado. O dia em que nasceste, há 15 anos atrás, será sempre o dia mais feliz da minha vida.


Maçã de Junho
Jorge Palma
És a estrela da alvorada
E a madrugada junto ao cais
És tudo o que eu vejo em ti,
És a alegria e muito mais
És a minha maçã de junho
És o teu corpo e o meu
Amo-te mais que à vida,
Que a vida sem ti morreu

És a erva perfumada,
Debruada a girassóis
O trago do café quente
Nas manhãs entre lençóis
És a minha maça de junho
E a minha noite de verão
Anda, vem comigo,
Vamos, dá-me a tua mão

És o encontro na estrada,
És a montanha e o pôr-do-sol
O vinho bebido em festa,
És a papoila e o rouxinol
És a minha maça de junho
E a minha estrela polar
Sem ti eu não tenho norte,
Sem ti eu não sei amar.

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