sexta-feira, 24 de junho de 2016

Lama

(onde nos sentimos mães de filhos alheios)



Acordámos hoje ao som do Brexit. Enquanto o meu amor desfiava excertos de notícias de diversos jornais online, eu não conseguia deixar de recordar o documentário que vi há uns dias. Ele fazia conjecturas e montava cenários possíveis, eu recordava a miséria que grassa na selva (des)humana de Calais. Ele citava políticos, eu ouvia o desesperado eco longínquo dos voluntários belgas. E os passos das galochas das crianças no meio daquele mar de lama. Diz que há centenas que estão largadas à sua própria sorte. Pior. Diz que há centenas que já foram apanhadas por redes de pornografia infantil. Cinco euros. O preço do sexo infantil, em Calais. A poucas horas de minha casa. No coração da Europa. E, de repente, o meu amor irrompe pelos meus pensamentos negros adentro. O ministro do interior francês avisou que ia suspender todas as medidas que impediam os refugiados de passarem a Mancha. Seres humanos como moeda de troca. Como arma de arremesso. Como vingança mesquinha. Que Europa somos nós, em pleno século XIX?

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