(onde se faz o elogio do inesperado
para alegria de um e desespero do outro)
Anunciaram
sol para o fim-de-semana, portanto decidimos trabalhar no quintal. O Vasco ficou todo contente. O
adolescente da casa resmungou. Parece que tinha de estudar.
Só
que nos levantámos tarde e a más horas… Mudámos de planos, inesperadamente.
Decidimos aproveitar a tarde para passear. O Vasco ficou todo contente. O adolescente da casa também. Só faltou
começar aos pulos, por se ver livre dos trabalhos forçados. Afinal, não tinha
assim tanto para estudar.
O
meu amor sugeriu irmos até Crupet, um sítio pitoresco não muito longe.
O Vasco ficou todo contente. Mas o adolescente da casa começou a ver a vida a andar para
trás, porque se impunha uma hora de carro.
Chegados
a Crupet, não vimos nada de muito pitoresco. Excepto talvez a torre da Rapunzel. Não
desistimos e fomos passear pelos campos ali à volta. O Vasco ficou todo contente. O adolescente da casa protestou
veementemente. Como tínhamos dito que íamos fazer turismo, tinha calçado os ténis
novos.
O
passeio soube-nos a pouco e o meu amor lembrou-se que estávamos perto de Ciney,
que ainda nenhum de nós conhecia. O Vasco ficou todo contente. O adolescente da casa começou claramente a
entrar em desespero. Ninguém o tinha preparado para aquilo. Porque não
lhe tínhamos dito que, afinal, íamos até ao fim do mundo, porque nem sequer tinha
o iCoiso carregado e nós precisávamos de ter o GPS ligado, porque já era
tardíssimo, porque ainda tinha tanto que estudar...
Chegados a Ciney, já não o podíamos ouvir. Decidimos calá-lo com um cachorro-quente, que é sempre uma aposta ganha. Demos uma volta pela cidade mas, com o turismo fechado, não sabíamos muito bem para onde ir, no Domingo à tardinha. O meu amor decidiu rumar a Dinant. Já que tínhamos chegado até ali, era só mais um pulinho. O Vasco ficou todo contente. O adolescente da casa perdeu de imediato a boa-disposição recém-conquistada graças à barriga cheia. E lançou a única cartada que lhe restava: no dia seguinte tinha escola e já era tãoooo tarde…
Ignorámo-lo
e lá fomos à aventura até Dinant. Como é evidente, quando chegámos já estava
tudo fechado. Inclusivamente a belíssima cidadela antiga, no cimo da cidade.
Nada que nos estragasse o passeio, que a arquitectura e o ambiente de uma terra
nunca fecham portas. O adolescente da casa começou por suspirar de alívio,
porque o teleférico parecia tenebroso. Mas, à medida que íamos deambulando
pelas ruas, começou novamente a resmungar. Tínhamos dito que ia passar
o dia a trabalhar no quintal e tinha vestido roupa velha, nada adequada a tão
citadino passeio. Apesar dos ténis novos, agora completamente sujos de lama.
Estávamos a passear calmamente à beira rio, quando
decidimos alugar um barco a motor para dar a volta ao rio que banha Dinant.
Os preços eram convidativos. E um dia não são dias. Ainda tínhamos uma hora de passeio pela frente até ao cair da noite. O Vasco ficou todo contente. Foi o
momento de glória do adolescente da casa, que teve autorização para ir aos comandos da
embarcação. Até se esqueceu de desencantar algo de mal para dizer.
Já estávamos
a voltar para o carro, quando nos apeteceu repentinamente fazer a
loucura total. Decidimos abrir a época do prato nacional: mexilhão com batatas
fritas. O Vasco ficou todo contente. O adolescente ainda nem se tinha refeito do passeio de barco, já estava
à mesa a alambazar-se com o segundo prato nacional belga: almôndegas com
batatas fritas. E foi vê-lo a rir-se e a falar pelos cotovelos o resto da
refeição.
Voltámos
para casa bastante tarde... bem mais tarde do que o recomendado, tendo em conta que no dia
seguinte havia escola. O pequeno deitado em cima do grande, ambos cansados e felizes.
Antes de adormecer, o adolescente implicante agradeceu efusivamente o dia tão
bem passado. Admitiu que lhe custa deixar-se guiar pelo imprevisto, uma
constante quando se vive connosco. Sabemos onde começamos, nunca sabemos como acabamos. Mas que é sempre tão, tão, tão bom…
Portanto, a lição de hoje que vou copiar para o meu caderno de "como domar um adolescente" é: comida e comando. Check.
ResponderEliminarNã, nã, nã... falsa noção de comando, Gralha. É mais seguro!
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