(onde vinte quilómetros parecem o dobro)
No
outro dia, fui buscar o filho crescido ao trabalho. Era bastante tarde. Estava
um frio glaciar. Nevava sem parar. Àquela hora da noite, os limpa-neves já não
passam. Ninguém passa. A estrada tinha desaparecido sob grossas camadas de
neve. A visibilidade era nula. E com os máximos ainda era pior. Avançávamos sem
saber exactamente onde estávamos, não havia um único ponto de referência. Com a
neve a bater de forma psicadélica no vidro da frente, como se estivéssemos a
entrar a alta velocidade num estranho túnel espácio-temporal. Onde somos
sugados. A verdade é que o tempo parece que pára. Senti que estavam reunidas
todas as condições para a dislexia conquistar terreno. Sorrateiramente. Entro
sempre um bocadinho em pânico, quando sinto que está prestes a acontecer. É como
se, de repente, acordasse dentro de um filme desconhecido. E o Diogo que falava
entusiasticamente, sem parar. Descrevendo com minúcia o dia de labuta. Os
pratos que preparou. Os pratos que serviu. Os pratos que recolheu. Os pratos
que lavou. Os clientes. Os colegas. O que fizeram e o que disseram. Um hipnótico
som ininterrupto que se vai distanciando, distanciando, distanciando…
Sem comentários:
Enviar um comentário