sexta-feira, 23 de maio de 2014

A nu

(onde se vislumbra o lado negro da força)


Desde que me conheço como gente que escrevo. Primeiro, na minha cabeça. Lembro-me de inventar histórias, que repetia vezes sem conta para mim mesma para não me esquecer. Até que aprendi a escrever “composições”. Depois, descobri os diários. E nunca mais parei. Durante toda a minha adolescência mantive diários. Também comecei a escrever poemas e histórias infantis. O meu amor maior. Quando saí da faculdade, com 22 anos acabados de fazer, casei e deixei de escrever. Tal como deixei de andar a cavalo. E de lutar pela minha felicidade pessoal. Perdi-me numa suposta díade. Durante esses treze longos anos, apenas escrevi uma história para o meu filho Diogo. De vez em quando, escrevia um ou outro conto infantil, que despejava para uma pasta perdida no meu computador. E nunca mais lhe pegava.

Nos quinze dias que tive para sair de casa e apagar dezoito anos de vida em comum, muitos foram passados a reler e a rasgar cadernos. Lia, rasgava. Lia, rasgava. Chorava. Perdi a conta aos sacos do lixo com pedaços de papel rasgado que enchi. Apaguei todo o meu passado. E arrependo-me até hoje.

Em Outubro de 2013 achei que estava na altura de recomeçar a escrever. Mas fui incapaz de voltar aos diários. Por outro lado, pensei que talvez o meu percurso de vida pudesse interessar a mais alguém. Assim, nasceu o “Amigo Imaginário”. Que também tinha como função substituir todos os amigos que deixei para trás e que tanta falta me fazem.

Depressa percebi que, quando escrevo neste blog, sinto o mesmo prazer que sentia quando escrevia os meus diários há tantos anos atrás. Um prazer feito de organização de ideias. Uma espécie de esvaziamento da lixeira do meu computador interno. Que eu não sou pessoa de ficar com coisas a remoerem-me o espírito muito tempo. Por isso, sempre gostei da sensação de liberdade que a escrita implica. Quando escrevo sobre um assunto, parece que consigo vê-lo sob novos ângulos. Analisá-lo. Aprofundá-lo. As soluções acabam por aparecer sozinhas. Ou, então, percebo que não há solução possível. Que o melhor mesmo é esquecer. Pelo menos, momentaneamente. A vida depois encarregar-se-á de encontrar a melhor solução.

Demorei algum tempo a decidir que rumo queria dar ao “Amigo Imaginário”. Por isso, tenho escrito menos. Têm chovido más notícias nos últimos tempos e eu não sabia como falar sobre isso. Comecei a narrar as nossas aventuras sem pensar muito na linha condutora subjacente a este blog. Mas, a dada altura, dei por mim a apagar textos que tinha escrito. A dada altura, dei por mim a autocensurar-me. Porque eram assuntos do foro privado, demasiado íntimos. Porque expunha outras pessoas. Porque queria proteger os meus filhos de uma realidade que está longe de ser cor-de-rosa. Porque sei que o inimigo anda à espreita nos lugares mais insuspeitos.

Acabei por perceber que isso não tem sentido. No dia em que escrever neste blog deixar de ser um simples prazer para passar a ser algo calculado, polido, limado, censurado… então, o “Amigo Imaginário” deixa de fazer qualquer sentido para mim. Portanto, aos poucos, vou esforçar-me por fazer aquilo que sempre fiz: passar a escrito o que me corrói a alma, na esperança de que as soluções apareçam. Porque sempre lá estiveram e eu não as conseguia ver. Porque desabafar pode não mudar nada mas, pelo menos, liberta a alma. E, neste momento, ter paz na minha vida é o meu maior desejo.

Os problemas hão-de acabar por ter uma solução. Mas a liberdade que a escrita me oferece é primordial para conseguir enfrentar o meu dia-a-dia. Podem tirar-me tudo, a paz de espírito só me tiram se eu deixar. E eu decidi que não deixo.
 

[ Nota para o inimigo que-vamos-fazer-de-conta-que-não-me-lê, mas que têm este blog no histórico do seu iPhone: EU VOU DAR LUTA. ]

5 comentários:

  1. E eu tenho muito prazer em ler o que escreves até quereres. Até te apetecer.
    Um xi-coração.

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  2. Nota deste lado, de quem sente algum pudor em comentar este post mas vai tentar ficar fora desse confronto que é só vosso: Gratidão pelo que partilhas e admiração pela forma como o fazes, sempre. Escreve, continua, o resto se resolverá.

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  3. A auto-censura é que não. Arranjarás forma de "libertar a alma". Ficarei com pena de não te ler mais, caso aconteça desfazeres-te do Amigo Imaginário.

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  4. Eu também quero continuar a descobrir o que lhe vai na alma e que se dispõe a partilhar connosco...Se acabasse iria ter muitas saudades!

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  5. 1. Tudo bem. Tu é que sabes - ou tens de saber... A (tua) vida é tua!

    2. Mas também podes escrever ou rescrever outras coisas e tentar usá-las ou publicá-las, como já sugeri.

    3. E, sim, o inimigo também te lê. Parece-me - sempre me pareceu - inevitável isso! Mas, mais uma vez, é uma opção tua escrever este blog ou não..

    4. Tenho (sempre tive) o maior desprezo por aquelas pessoas que o Alberto Pimenta caracterizou como fdp, sejam pequenos fdp ou grandes fdp. Li o (pequeno) livro várias vezes, e desde há muitos anos, e devo mesmo ter dois ou três exemplares, pois às vezes emprestava-o ou oferecia-o

    [Pode ver-se um excerto aqui: http://triplov.com/poesia/Alberto_Pimenta/Filho-da-puita/index.htm - ou comprar o livro na FNAC, aqui http://triplov.com/poesia/Alberto_Pimenta/Filho-da-puita/index.htm]

    5. E acho que é obrigação de todas as "pessoas de bem" detectar e denunciar os fdp. E, só porque sou contra a pena de morte, não digo que os fdp "devem ser exterminados", mas apenas que devem, ao menos, ser manietados e impedidos de actuar, em vez de incentivados, com elogios, aceitação de "benesses" ou manifestações de (falsa) neutralidade.

    6. E a leitura do Alberto Pimenta deu-me alguma agilidade para identificar um pequeno fdp a partir de traços que ainda não são muito visíveis e, portanto, não me surpreender muito quando eles se tornam visíveis ou quando o pequeno fdp se torna num grande fdp.

    E a perceber que, quando se está atento para isso, é extremamente fácil distinguir entre o que é uma pessoa sincera (mesmo que tenha cometido erros) do que é um fdp (pequeno ou grande, tanto faz para o caso). E não creio que os laços familiares me afectem nesta análise, pois ela tornou-se-me tão automática que a aplico a toda a gente à volta.

    7. Se os fdp me provocam asco, aquelas pessoas que dizem que querem (e pensam que conseguem) "ficar fora do confronto que é só vosso", mas nunca se lembraram de apanhar um voo low cost para matar as saudades, e aproveitam as vindas cá dos miúdos para o fazer (nalguns casos recebendo-os até para dormir em casa delas - o que NUNCA tinham feito enquanto eles viviam em Portugal), sem perceberem que, com isso, fazem o jogo de uma das partes (e, por acaso, da parte que é fdp), essas pessoas, dizia, não me provocam asco, mas provocam-me desprezo.

    8. É que isto é mesmo muito simples: quem não está contra os fdp, está - quer queira que não, quer perceba, quer não - a FAZER O JOGO deles! Tal gente não me merece nenhum respeito, nem nenhuma consideração.

    9. Ora um post neste blog a explicares as despesas médicas efectuadas e que nunca te foram pagas - só para dar um exemplo de uma das muitas e variadas manifestações de fdp-ismo, talvez fosse um interessante complemento a tanto do que tens escrito. E talvez algumas pessoas percebessem do que estão a falar, sem conhecimento completo dos factos.

    10. E se, mesmo assim, não percebessem, então não haveria dúvidas de que não percebem PORQUE NÃO QUEREM PERCEBER. E daí se poderiam tirar algumas conclusões claras e definitivas (interessantes ou desinteressantes, conforme...).

    11. E, sobre isto não tenho mesmo mais nada para dizer, nem aqui, nem em qualquer outro local ou circunstância. Mas, sendo hoje em Lisboa a final da "Champions", e vindo aí o Mundial (a Copa, diz-se em brasileiro), tinha mesmo de acabar no número 11 ;-)

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